Diário do Paciente

Voz esofágica: a experiência de um sobrevivente

Meu nome é Osório José Amandio, sou advogado, tenho 71 anos e sou laringectomizado total. No dia 21 de junho de 2012, foi constatado que eu estava com um câncer de laringe e no dia 11 de julho de 2012, já acordei da cirurgia sem voz, visto que as pregas (cordas) vocais também são retiradas. Foi tudo muito rápido, mas já no dia 15 de agosto de 2012, eu estava indo à primeira reunião do “GALA” – Grupo de Apoio ao Laringectomizado.

O “GALA” é um grupo, organizado pela Liga Feminina de Combate ao Câncer do Rio Grande do Sul e conta com fonoaudiólogas, fisioterapeuta, musicoterapeuta e estagiários das áreas afins e é coordenado pela fonoaudióloga Vera Beatris Martins, neste grupo todos são voluntários.

O grupo funciona uma vez por semana, às quartas-feiras das 10h às 11h30, nas dependências do Hospital Santa Rita dentro do Complexo Hospitalar Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre/RS. Esse grupo e muito importante para nós, pois conta com profissionais abnegados e sempre dispostos a levantar a nossa autoestima. O foco principal é ensinar as técnicas e exercícios para que os pacientes apreendam a fala com a voz esofágica.

A partir de 05 de setembro de 2012, passei a frequentar semanalmente as reuniões das quartas-feiras, além dos ensinamentos ministrado pelas fonoaudiólogas e os exercícios de fisioterapia, continuei com as minhas pesquisas na internet, pois no início os constantes exercícios são fundamentais para melhorarmos nossa voz esofágica, embora até hoje eu ainda faça exercícios de voz.  Já no fim do mês de setembro de 2012 eu já estava falando frases com a voz esofágica, pois ela é conseguida através da deglutição incompleta de ar (apenas até ao esôfago), e de sua expulsão em seguida modelando o ar em sons pelo movimento coordenado da boca e língua, essa técnica implica em várias etapas como a independência da fonação e da respiração. É preciso aprender a sincronizar a fonação com a deglutição do ar e não com a respiração como era antes da cirurgia, saber controlar a ansiedade e de um treinamento persistente e intensivo após a cirurgia. Posso afirmar que esse processo deve ser orientado e acompanhado por um fonoaudiólogo que tenha conhecimento das condições e necessidades de um laringectomizado total para aprender a falar com a voz esofágica. Sou muito grato às fonoaudiólogas Vera Beatris Martins e Marcia Santana, que foram as primeiras a me ensinarem a falar com a voz esofágica.

Sinto-me tão bem que às vezes esqueço que sou um laringectomizado total, pois nós temos algumas restrições, por exemplo, eu falo por telefone com meus familiares e com as pessoas que sabem da minha condição e elas me entendem perfeitamente. Já com pessoas que não me conhecem é um pouco mais difícil, como falar em local com muito ruído é complicado, pois a voz esofágica é baixa, mesmo assim, me sinto muito bem e não pretende colocar uma prótese de voz.

O nosso Grupo de Apoio ao Laringectomizado – GALA, incentiva os pacientes que participam das reuniões a falarem com a voz esofágica. Eu também sou um grande incentivador da voz esofágica, embora saibamos que além dela, temos:

  • Voz traqueoesofágica que se conseguida após a implantação de uma prótese traqueo-esofágica, que permite a passagem de ar dos pulmões para o esôfago podendo este, posteriormente ser modelado em sons pelo movimento coordenado da boca e língua. A desvantagem é que geralmente a prótese tem vida útil muito curta;
  • Eletrolaringe ou laringe eletrônica que é um amplificador movido a bateria ou pilha que é colocado junto da região submentoniana ou na porção mediana do pescoço e emite ondas vibratórias que são modelados em sons pelo movimento coordenado da boca e língua. O som originado por estes aparelhos tem uma percepção pelos interlocutores como “artificial” (voz de robô), esta solução e mais usada por laringectomizados que não conseguem aprender nenhuma das outras técnicas de reabilitação de voz.

Encerro com um provérbio chinês que gosto muito:

Não há que ser forte. Há que ser flexível. Provérbio Chinês.

Todo mundo sabe o quão difícil é superar certos obstáculos, os problemas às vezes parecem não ter solução e a primeira coisa que nos vem à cabeça é: “preciso ser forte”, “preciso me fortalecer para superar os obstáculos que foram colocados na minha vida”. Mas, muitas vezes esse “fortalecer-se” é fechar-se, é não enxergar outras possibilidades, é pensar que ser forte é ser intransponível, quando na verdade, ser forte é ser flexível.

Osório José Amandio é advogado, tem 71 anos, sobrevivente de um câncer de laringe. Participa do grupo de apoio GALA e escreve conteúdos no blog da ACBG Brasil.

 

 

 

 

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